Jovens de diversos países procuram o conservatório da região para estudar música; este ano, são 71 estrangeiros matriculados na instituição
Já virou até brincadeira entre os estudantes do Conservatório Dramático e Musical Dr. Carlos de Campos, de Tatuí: quando alguém pergunta onde fica a instituição, a resposta pode ser o terceiro peruano à esquerda.
E a piada tem fundamento: considerado o melhor conservatório da América Latina, a instituição conta hoje com 52 estudantes peruanos, três argentinos, 10 paraguaios, dois chilenos, um boliviano, um equatoriano, uma norte-americana e até um coreano.
Basta dar uma rodada pelo pátio do conservatório para encontrar alguns estrangeiros estudando seus instrumentos ao ar livre e ouvir, entre uma conversa e outra, algum sotaque do portunhol. Aliás, quem chega pela primeira vez ao conservatório fica encantado ao ver tantos estudantes tocando seus instrumentos em bancos espalhados pelo pátio.
A argentina Marisa Laura Albaniz, 33 anos, que está há sete anos estudando percussão erudita em Tatuí, já está tão habituada com o país que fala português até mesmo entre os outros argentinos. Ela reitera que o Conservatório de Tatuí é referência entre os músicos de seu país e também em outros países. Agora tem um francês na minha casa que veio conhecer o conservatório. A escola tem destaque mundial, ressalta Marisa e acrescenta: Acho que atualmente tem mais estrangeiros por aqui do que quando eu cheguei. Muitos que estudam aqui acabam indicando para outros amigos.
O peruano Alex Carrasco Castro, de 24, estuda trompete e disse que chegou ao conservatório por indicação dos amigos que já estudavam em Tatuí e narravam suas experiências enriquecedoras. Aqui tem muito profissional competente. Um nível musical excelente e alguns amigos meus, que já estavam por aqui, mandavam email falando disso. Acabei vindo também, relata o jovem, que mora em uma república com mais dois peruanos.
Wilder Ivan Gonzales, de 26 anos, também peruano, estuda trombone em Tatuí há quatro anos e atualmente vive com a bolsa concedida pela instituição. Vale ressaltar que o conservatório fornece 307 bolsas de estudo em diversas categorias. Na modalidade estímulo, o valor repassado é de R$ 415 mensais. Na modalidade auxílio, o valor é de R$ 470. Na modalidade ofício, chega a R$ 700. É uma alternativa interessante para os estrangeiros. Se eu não tivesse esse benefício, já teria voltado para o meu país, avalia Wilder.
Para matar a saudade da família, Wilder, sempre quando pode, volta para o Peru. A gente tenta aproveitar as promoções de voo, explica ele, que já enfrentou quatro dias e meio de viagem de ônibus para voltar ao país. Ainda dei sorte, tem gente que leva seis dias, ressalta.
Já Oscar Aldama, paraguaio de 24 anos, estuda piano no conservatório e não tem que enfrentar essa epopéia. Eu volto sempre fazer visitas. De busão, leva um dia, confirma o paraguaio, que usa a gíria brasileira naturalmente. Mas ele lembra da aventura que foi chegar até Tatuí para fazer o teste de ingresso no conservatório. A gente desceu na rodoviária de São Paulo e sem falar português, apenas pedíamos: Tatuí, Tatuí. Até que alguém nos ajudou.
Se Oscar Aldama recorda das difuldades que teve com o português quando chegou no Brasil, dá para imaginar o que o coreano Sungchi Kim, que veio para Tatuí estudar guitarra, tem passado. Sem falar nada de português, a não ser palavrinhas-chaves como obrigada, tchau e olá, a reportagem do Mais Cruzeiro, com muita sorte, conseguiu entrevistar Kim. Explica-se: o coreano, que mora há muitos anos no Japão, acabara de encontrar um novo amigo que, simplesmente, falava japonês, o estudante Yukio Torihara, que serviu de tradutor. Kim explicou que veio até o Brasil exclusivamente para estudar no Conservatório de Tatuí. Tem muitos termos técnicos que são universais e ele vai tentando se orientar através deles, informou o tradutor. Disse ainda que está muito feliz por poder aprender na terra de grandes como Tom Jobim e João Gilberto, acrescentou. Bossa Nova, explicou Kim diretamente para a repórter.
Para facilitar a comunicação entre os estudantes estrangeiros, um dos projetos do Conservatório, conforme a assessora da instituição, Deise Juliana, é divulgar as notícias da escola em versões em inglês e espanhol através do site.Um dos frutos interessantes desse convívio entre brasileiros e os outros estrangeiros latinos é o grupo Compadre Candela, do qual o paraguaio Cesar Cardozo, de 25 anos, é vocalista. Ele, que estudava sax no conservatório, aceitou o convite para cantar na banda de salsa, que surgiu como um projeto de intercâmbio cultural. Se por um lado os brasileiros nos ensinam o samba, nós podemos ensinar a salsa, comenta ele.
Outro dos integrantes do grupo é o peruano Juan Pablo Ramos Valenzuela, de 24 anos, que estuda trompete. Esse ano a gente quer se apresentar ainda mais com esse grupo. E promover esse rico intercâmbio cultural, ressalta.